Obama em África:<br>uma visita falhada

Carlos Lopes Pereira

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A crescente concorrência económica em África entre os Estados Unidos e a China esteve no centro da recente visita de Barack Obama a três países do continente. A viagem ficou marcada também pelo eclodir do escândalo de espionagem denunciado pelo ex-agente da CIA Edward Snowden e por manifestações anti-imperialistas.

O presidente norte-americano esteve no Senegal, na África do Sul e na Tanzânia. Teve encontros com os seus homólogos Macky Sall, Jacob Zuma e Jakaya Kikwete, discursou sobre as maravilhas da democracia ocidental, falou a estudantes universitários, deslocou-se à ilha de Goréia – um antigo entreposto de escravos ao largo de Dakar – e conheceu no Cabo a prisão de Robben Island, onde Nelson Mandela passou 18 dos 27 anos de prisão em que esteve encarcerado pelo apartheid.

Antes da viagem, no final de Junho, o «Washington Post» revelou que a visita de Obama custaria aos contribuintes norte-americanos cerca de 100 milhões de dólares. Incluindo despesas com centenas de agentes dos serviços secretos, caças para escoltar o Air Force One, um navio de guerra equipado com um hospital e aviões de carga para transportar 56 veículos, incluindo 14 limusinas de luxo.

Após o Senegal, «uma das mais estáveis democracias em África» – que alberga uma base militar francesa –, a África do Sul foi a segunda etapa da visita.

Obama foi recebido na África do Sul com protestos populares e, ao contrário do que planearam os propagandistas da Casa Branca, não conseguiu o encontro com Mandela, internado em estado crítico num hospital de Pretória. Falhou a mediática «fotografia para a História» do primeiro presidente afro-americano ao lado do primeiro presidente sul-africano eleito democraticamente.

No meio de repetidos elogios a Mandela, Obama prometeu o «Power Africa», um programa de sete mil milhões de dólares, em cinco anos, para electrificação em seis países – Gana, Líbéria, Nigéria, Etiópia, Quénia e Tanzânia.

Uma oferta «com toda a conhecida generosidade da parte dos dirigentes norte-americanos face ao resto do mundo», como escreveu a jornalista Christine Abdelkrim-Delanne na «Afrique Asie». Oferta, aliás, que vai contar com o «contributo» de multinacionais como a General Electric ou a Symbion Power…

NObama Campaign

Conta a edição on-line da revista que, em vésperas da chegada de Obama à África do Sul, a Sociedade para a Protecção da Constituição depositou num tribunal de Pretória uma queixa acusando o presidente norte-americano de crimes de guerra e contra a Humanidade pela morte ou mutilação de 3000 pessoas, entre as quais 176 crianças, devido à utilização ilegal de drones.

Para além da queixa na Justiça, um movimento intitulado NObama Campaign reuniu a adesão de associações e organizações de todo o espectro político e social sul-africano e promoveu manifestações populares à passagem do presidente norte-americano por Pretória, Soweto e Cidade do Cabo.

Entre as entidades apoiantes figuram o Partido Comunista, a central sindical Cosatu – dois aliados do ANC na governação –, diversos sindicatos, a Federação Sindical Mundial, a Sociedade dos Amigos de Cuba, o Congresso dos Estudantes e a Associação dos Estudantes Muçulmanos.

Os manifestantes proclamaram que a visita de Obama não era bem-vinda e que a amizade entre a África do Sul e os EUA devia assentar na justiça, na liberdade e na igualdade, valores sempre violados pelo imperialismo norte-americano. Denunciaram a política internacional estado-unidense que fomenta «a mercantilização da guerra, a sobre-exploração neocolonial, o racismo e a destruição ambiental». E afirmaram que os EUA, sob a presidência de Obama, «intensificaram os ataques contra os direitos humanos, a militarização das relações internacionais e a exploração contínua e sem controlo dos recursos mundiais à custa dos povos oprimidos».

Mais claro foi o dirigente da Liga dos Jovens Comunistas, Buti Manamela, ao falar numa manifestação em frente da embaixada dos EUA em Pretória. Para ele, «Obama está aqui não por África mas pelos interesses do imperialismo americano, em especial a continuação da exploração dos nossos recursos minerais».

Já em Dar-es-Salam, Obama assegurou que vê a África como «uma grande história de sucesso mundial» e que os EUA querem ser parceiros desse êxito. E apelou a um novo modelo de parceria «que não seja alicerçado na ajuda e na assistência mas no comércio e na cooperação».

Todo um programa, lembra Christine Abdelkrim-Delanne, que a China desde há muito pôs em prática em África…



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